Rosarno/Calábria – Dois imigrantes africanos – um nigeriano sem documentos e um refugiado político do Togo, cujos nomes nao foram divulgados – foram atingidos por tiros de pistola de ar comprido na quinta-feira (07/01), disparados por integrantes da Máfia local – a poderosa “Ndrangheta” - desencadeando uma revolta racial, a primeira de 2010, que já dura dois dias, em Rosarno, Calábria, sul da Itália.
Por causa do ataque centenas de imigrantes africanos, jovens trabalhadores temporários contratados pelos agricultores locais, que trabalham até 18 horas por dia colhendo laranjas e tangerinas, marcharam pelas ruas, atacando com paus e pedras carros e queimando sacos de lixo.
Os jornais europeus – em especial, o La República, da Itália, e El País, da Espanha – informam neste sábado (09/01), que o balanço da revolta, por ora, são 34 feridos, oito presos e um número não determinado de pessoas com ferimentos leves. Dois imigrantes africanos estão internados, em estado grave, depois de serem atingidos por tiros nas pernas.
Centenas de imigrantes africanos começam a deixar a cidade, sob proteçao de Carabineros - a Polícia italiana - e da Defesa Civil, temendo novos ataques. O primeiro balanço da Polícia falava em 37 pessoas feridas - 19 imigrantes e 18 policiais.
Violência racial
O presidente da República, Giorgio Napolitano, pediu o fim da violência racial. O ministro Italiano do Interior, Roberto Maroni, já havia declarado que a “Itália havia sido demasiado tolerante com a imigração nos últimos anos”.
O ministro reconheceu que, em Rosarno, "se vive uma situação dificil como em outras cidades, porque em todos estes anos se tolerou, sem se fazer nada de eficaz, uma imigração clandestina que alimentou, por uma parte, a criminalidade, e por outro gerou uma situação de forte degradação”.
A rica zona agrícola de Piana de Rosarno está dominada por empresas vinculadas a “Ndranghetaª, a poderosa Máfia local. Os cerca de 3 mil trabalhadores que, segundo se calcula, estão agora na região, vivem em condições subhumanas, em depósitos ou fábricas abandonadas, sem banheiros nem camas, e são recrutados por capatazes da Máfia que tem o controle das terras.
Os chefes mafiosos locais escolhem os trabalhadores mais fortes ao amanhecer, como se fôssem um mercado de gado, segundo o jornal La República. A jornada é de 20 Euros diários (o equivalente a cerca de R$ 53,60) e dura entre 12 e 14 horas.
Os escolhidos devem pagar uma comissão de cinco Euros aos feitores por quem são escolhidos. Os temporários são na maior parte da África Central e do Magreb.
Há dois anos, ocorreram incidentes semelhantes em Rosarno, e depois em Caltelvolturno (Campania), quando grupos de imigrantes se enfrentam com a Camorra, depois do assassinato a tiros de companheiros.
A imprensa européia, em especial o El País, da Espanha abre neste sábado a manchete “Los esclavos africanos se rebelan en los campos mafiosos de Calabria” (Os escravos africanos se rebelam nos campos mafiosos da Calabria).
Segue a tensão
A tensão por causa da revolta continua, porque alguns vizinhos calabreses tentaram linchar trabalhadores que marchavam até a cidade para pedir ao prefeito melhores condições de vida e o fim da violência.
“Necessitamos proteção porque sofremos continuamente atos de violência racista”, disse Siski, um imigrante de 25 anos, segundo relata o El País.
Cerca de 300 policiais antidistúrbios foram chamados de cidades próximas para tentar evitar choques entre cerca de 700 imigrantes e 300 moradores. Um morador, Giuseppe Bono, de 38 anos, foi preso por tentar atacar os africanos com um trator. Jovens locais, preparados para novos confrontos, permanecem estacionados no centro do povoado.
Segundo o relato das televisões locais, as ruas de Rosarno, vivem um clima de “cassa ao negro”. O comércio está fechado e disparos foram feitos para o ar. Jornalistas tambem foram atacados porque moradores não querem testemunhas.
A revolta teria começado depois de um falso rumor de que uma mulher supostamente agredida por africanos estava grávida e havia perdido a criança.
Posição da Igreja
A Conferência Episcopal Italiana condenou “os atos de violência e a situação de extrema dificuldade que vivem os imigrantes, sem ajuda nem humana nem econômica. Segundo Bruno Schettino, presidente da Comissão Episcopal para as Imigrações, “o episódio representa um signo de intolerência e degradação humana”.
A Revista Ffmagazine, próxima da Fundação Farefuturo, de Gianfranco Fini, afirmou que “na Itália existe escravidão e um Estado cívico, moderno e democrático nao pode tolerar que milhares de pessoas vivem na indigência mais absoluta”.
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