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domingo, 7 de março de 2010

Audiência pública do STF mantém racismo e pobreza no centro do debate

                Durante quatro horas, na manhã desta quarta-feira, especialistas, gestores, advogados e professores manifestaram argumentos favoráveis e contrários às cotas raciais adotadas por universidades brasileiras. O sistema da Universidade de Brasília, questionado em ação do partido Democratas que tramita no Supremo Tribunal Federal, serviu de pano de fundo para um debate que se estende a outras instituições brasileiras e que servirá para dar subsídios aos ministros do STF para julgar a ação contra a UnB.
                 Os argumentos apresentados pelos representantes dos dois lados não surpreenderam. A maioria dos designados para falar no primeiro dia da audiência pública convocada pelo ministro do STF Ricardo Lewandowski, relator do ação do DEM, defendeu as cotas utilizando como justificativa a necessidade de combater a discriminação com a população negra, de resgatar uma dívida histórica com eles e acabar com as desigualdades econômicas e educacionais entre brancos e negros.

                 Do lado de quem é contra a política de reserva de vagas adotadas por muitas instituições brasileiras, a preocupação com a possibilidade de criar divisões entre a sociedade após a criação do sistema, a dificuldade de distinguir quem é ou não negro e a adoção de cotas para os estudantes mais pobres foram as ideias mais defendidas na audiência.
                Roberta Fragoso Kaufmann, advogada voluntária do DEM, ressaltou que não pretende com a ação contra a UnB questionar a constitucionalidade das políticas de ações afirmativas e, sim, o critério escolhido pela universidade: o racial.
                Grande parte dos especialistas se concentrou, aliás, em justificar as escolhas dos critérios de seleção de candidatos para as cotas. A vice-procuradora geral da República, Débora Duprat, lembrou que mulheres, indígenas e negros foram, durante muito tempo, “desconsiderados como sujeitos de direito e colocados em espaços de invisibilidade”. Ressaltou que mulheres e pessoas com deficiência conseguiram aprovar políticas de inclusão específicas e, agora, acredita ser necessário fazer o mesmo com os negros.
             Maria Paula Dallari Bucci, secretária de Educação Superior do Ministério da Educação, também defendeu as cotas raciais. Ela apresentou dados sobre a realidade de estudantes brancos e negros nas escolas brasileiras. A média de anos de estudo dos alunos negros é de dois anos a menos que os brancos. Além disso, mesmo após a universalização de vagas no ensino fundamental, os números de matrícula dos estudantes revelam que a relação de freqüência entre brancos e negros permanece desigual há 20 anos. A população branca que frequenta a escola é quase o dobro da negra.
              “Mesmo com todo o avanço da educação brasileira, a distância entre eles permanece a mesma. Isso demonstra que a simples passagem do tempo não muda a realidade das coisas”, afirmou.
               Em entrevista ao iG, a secretária afirmou que a autonomia das universidades deve ser privilegiada nessas discussões. “Espero que a Suprema Corte consolide essa linha de constitucionalidade das cotas já percebida por diferentes instâncias judiciais e que a autonomia das universidades seja prestigiada, deixando a cargo delas definir os vários modelos de implantação do sistema”, avaliou.
           
 Renda familiar


               A advogada do DEM nesta ação, Roberta Kaufmann, lembrou, durante os 17 minutos em que discursou, que o partido defende a adoção de outros critérios para as políticas afirmativas. Como a adoção de cotas para os estudantes mais pobres. “Com a política de cotas sociais, atingiremos o desiderato da integração da população negra sem corrermos o risco da racialização do país”, defendeu.
              Além de basear o julgamento da ação contra a UnB, que reserva 20% para cotistas, a audiência pública servirá para dar subsídios para a análise de outra ação que questiona o sistema de cotas e tramita no tribunal. O estudante Giovane Pasqualito Fialho ajuizou um recurso contra o sistema de cotas adotado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Lá, 30% das vagas são destinadas aos estudantes de escolas públicas e, desse porcentual, metade fica com os estudantes negros.
               O advogado de defesa de Giovane também questionou o critério de distribuição de vagas para egressos de rede pública. Segundo ele, o sistema da UFRGS privilegia estudantes que saem de Colégios Militares e federais, que têm o melhor ensino público do estado e não precisariam do benefício para estar no ensino superior. “Precisamos lembrar também que as políticas de cotas incluem e excluem automaticamente, porque elas deixam de fora estudantes que teriam mérito para estar na universidade”, defendeu.
               A audiência pública sobre as cotas continua até sexta-feira. O julgamento da ação ainda não tem data para acontecer. Lewandowski admitiu que, apesar de ser um ano eleitoral, gostaria que os ministros do STF julgassem o mérito da ação ainda este ano.
                Fonte: Priscila Borges, iG, Brasilia

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